sábado, 27 de março de 2010

Uma nota acerca do realismo em "A Oeste Nada de Novo."

"A realidade que o cinema à vontade reproduz e organiza é a realidade do mundo que nos impregna, é o continuum sensível pelo qual a película se faz moldar tanto espacial quanto temporalmente."
André Bazin

Lewis Millestone empreendeu em 1930 a representação da experiência da guerra por meio do cinema quando filmou o clássico literário "A Oeste nada de novo". Antes mesmo da teoria Bazaniana da defesa do cinema como arte do real e como consequëncia de um processo histórico de busca pela representação do mundo (do renascimento à fotografia) Milestone investe neste realismo, em que a tipologia idealista dos heróis de guerra em defesa da pátria contra os inimigos (clichê holywoodiano por excelência),se desfaz. Aqui, o que se revela é uma camêra-testemunha que acompanha soldados para um "ritual de morte", em que cada sequëncia tematiza a perda, a miséria, a dor, a vivência do choque. Para tanto a montagem, como quer Bazin, está à serviço deste "real" que se eterniza quando se torna espetáculo, quando se reproduz no cinema. Uma montagem invisível sem inferências simbólicas, a serviço da narrativa e da intensificação emitida pelos fatos, por meio da camêra e da montagem invisíveis e da mis-en-scene naturalista de atores que podem ser amadores e/ou profissionais. Bem distante das teorias do cinema clássico, como a de Murstenberg ou de Pudovkin, em que, justamente, a especificidade do cinema - sua linguagem - está na sua estilização, pois a câmera e a montagem devem se moldar ou às nossas operações mentais (Murstenberg) ou à valoração das coisas e "visão de mundo"(Pudovkin), em favor dos efeitos ilusionistas, aprimoradas e sistematizadas por D.W Griffith.
No filme de Milestone, o discurso moralizante da guerra é o discurso anti-guerra , mas não diz respeito às escolhas individuais de um personagem, e, sim, ao discurso ideológico do nacionalismo em confronto com um real despido de qualquer sentido. É este real eternizado pelo cinema, no qual a morte é figura central (pois é aqui, diferente de Benjamim, que sua aura e unicidade se intensificam) é um dos fundamentos da defesa de André Bazin ao caráter intrisicamente realista do dispositivo cinematográfico.

terça-feira, 9 de março de 2010

Questões sobre o filme "A Oeste Nada de Novo"

No último encontro assistimos ao filme All Quiet on the Western ("A Oeste Nada De Novo"), dirigido por Lewis Milestone. O filme é uma adaptação do romance autobiográfico de Erich Maria Remarque(1898-1970) Im Westen nichts Neues ("Nada de Novo no Front"), publicado em 1929. Lançado apenas um ano depois da publicação do livro, o filme ganhou o Oscar ("melhor filme" e "melhor realização") e vendeu um milhão de cópias só na Alemanha.


Como só assisti ao filme uma vez, não tenho como fechar uma análise, mas pude levantar alguns pontos para uma possível discussão:

1. Dei uma olhadela no livro e, até onde pude perceber, a diferença mais marcante em relação ao filme diz respeito ao ponto de vista, que no romance acompanha sempre o protagonista Paul Bäumer, com o qual o leitor rapidamente se identifica. O livro é escrito como um diário de guerra. Esse procedimento narrativo, no qual o autor se coloca como testemunha dos eventos, foi utilizado por muitos escritores que participaram da 1ªGuerra: basta dar uma olhada nos romances de Henri Barbusse, Jules Vallès, Roland Dorgelès, Ernst Junger sobre a 1ª Guerra, quase todos utilizam vasto material auto-biográfico e escrevem diários de guerra.

Após assistir ao filme, fiquei com a impressão de que, nele, a identificação com o protagonista “Paul Baumer” é menor do que no romance, e só ocorre da metade do filme em diante. Gostaria de saber a opinião de vocês sobre essa questão. Para mim isso fica evidente na seqüência principal do campo de batalha, onde a câmera não acompanha o protagonista. O Bruno chamou minha atenção para a série de travellings que a câmera realiza nessa seqüência. Nesses movimentos, se bem me lembro, a câmera assume o ponto de vista de uma metralhadora, invenção fundamental na arquitetura dos combates nessa fase inicial da I Guerra, que é a “guerra de trincheiras”. É consenso entre os historiadores que as metralhadoras praticamente ditaram as regras do combate até invenção do tanque de guerra pela Inglaterra, em 1918. No início da guerra, o exército francês desprezou o poderio das metralhadoras, confiando em seu imenso contingente de soldados, o resultado foi um recuo muito rápido motivado pelo imenso número de baixas. Voltando à seqüência em questão, acho que dá até para falar-se em “protagonismo da técnica”, já que o papel da subjetividade central é substituído pelo aparato técnico de guerra, e aqui é impossível não pensar num paralelo entre os aparatos técnicos da guerra e do cinema.

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2. O Paulo notou que a duração e a arquitetura das seqüências prenuncia a estética do neo-realismo, na qual a atenção do espectador deve centrar-se nos eventos filmados e não na edição. Tal atitude implica seqüências mais longas, pois cortes sucessivos evidentemente direcionam muito mais a atenção do espectador, criando a sensação de velocidade na narrativa e determinando os elos causais entre os elementos da intriga, por isso há menos espaço para o imprevisto.

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Download de textos sobre cinema

Pessoal, no blog "http://letrasuspdownload.wordpress.com/" é possível baixar alguns textos sobre cinema, inclusive o livro de ensaios sobre cinema do Bazin, com prefácio do Ismail Xavier.
Tem também livros do Ismail e um link para outro site com 170 textos sobre cinema. Aproveitem, porque não sei até quanto o site ficará no ar.

Blog do grupo de estudos "Experiência do Cinema"

Para quem não veio ao último encontro: criamos esse blog coletivo para que os integrantes do grupo de estudos "Experiência do Cinema" possam escrever suas reflexões sobre os filmes apresentados e os textos escolhidos. A idéia, claro, é criar uma ponte entre filmes e textos teóricos, o que raramente dá para fazer durante as reuniões, pois a exibição dos filmes por si só já exige bastante tempo e energia dos participantes. Todos serão co-autores do Blog e poderão editá-lo como bem entenderem.